quarta-feira, 29 de agosto de 2007

O calor de Agosto!

Quando eu era pequenina, gostava de andar descalça. A minha mãe, com a sua sabedoria avisava para o não fazer por causa de todos os perigos e mais alguns. Mas eu mal a via distraída tirava as sandálias e as "soquettes" brancas como se usava na altura. Colocava os pés no chão fresco de pedra. Que alívio!! O silêncio, a calma e eu ali descalça! O prazer que estas pequenas coisas nos davam! Menina travessa. A calma dos dias quentes!
Depois corria pelo quintal sob um sol abrasador. Saltava de pedra em pedra para não queimar os pés. Era Agosto! Os termómetros passavam dos 40º! A calçada queimava. As ruas da aldeia estavam desertas nas hora
de maior calor. O casario mantinha as portas e as janelas fechadas para conservar o fresco dentro das suas paredes caídas de branco. A aldeia parecia como que adormecido.
E eu ali descalça a receber o fresco do chão de pedra da minha casa.
Um dia, em que mais uma vez eu desobedeci e voltei a praticar aquele pecado, pisei uma abelha e ali ficou ela depois de me ter “oferecido” o ferrão, debaixo do meu pé! Ela quieta, aprisionada. Eu calada, ninguém podia saber! Não levantando o pé, silenciava a dor e escondia o orgulho ferido. Como confessar que a minha mãe tinha razão?? Ela podia ter dito quais eram os perigos, pensava eu, magoada. Não aguentado a dor do pé (ou da alma?) gritei em plenos pulmões, despertando da letargia própria de quem vive e convive com o Verão do Alentejo, naquela hora de maior canícula. O gato acordou e espreguiçando-se, mirou-me sem me reconhecer. O cão ladrou. Até as galinhas esvoaçaram apavoradas no galinheiro e o galo cantou fora de horas. Os pássaros levantaram voo, os homens que espreguiçavam na taberna mesmo ao lado da minha casa, calaram-se, estranhando que alguém tivesse a coragem de perturbar aquela placitude. As lágrimas corriam livremente agora que a minha mãe tratava da consequência da desobediência. Ela ralhava e eu chorava.
Pouco depois tudo voltou ao normal, os animais adormeceram, os homens voltaram à
indolência habitual das 3 da tarde, naquele mês quente de Agosto.
Andei uma semana descalça, o pé não cabia na sandália!! Estava nas minhas sete quintas, expressão que sempre encontro para descrever o meu estado de felicidade.
Ainda hoje e passados já tantos anos, gosto imenso de andar descalça pela casa, saboreando o fresco do chão em dias de grande calor. Trás-me à memoria lembranças.

3 comentários:

Elvira Carvalho disse...

Eu também andava descalça no Verão. Não porque gostasse muito, e até gosto... mas porque não tinha que calçar. No inverno usava umas tamanquinhas de madeira, que o meu pai fazia, e meias de lã de ovelha, feitas pela minha mãe. De verão andavamos descalços. Viviamos num velho barracão de madeira, assente nuns pilares de cimento, junto á margem do Coina.
Descíamos por umas escadas. Com as marés vivas de Agosto, a água vinha até á porta. E era só sair e mergulhar na água.
Da parte de cima, do barracão, havia um pinhal, e um silvado. No tempo das amoras é que era mais difícil andar descalça. Porque gostavamos das amoras e os picos cravavam-se nos pés...
Mas ainda hoje, quando chega o Verão, mal entro em casa, fico logo descalça.
Só tenho cuidado quando passo a ferro. Sabia que se a ligação á terra da ficha do ferro, estiver em más condições, e você estiver descalça pode morrer eletrocutada?
Um abraço

Franky disse...

Felizmente eu tinha umas sandálias para o verão e umas botas "cardadas", (essas sim, eu detestava e não podia descalçar porque estava sempre doente), para o Inverno. Não tinha mais que os dois pares de calçado, se bem que nas festa especiais da Aldeia se estreava sempre alguma coisa. Não sapatos, que quando ficavam apertados havia sempre uma maneira de lhes contar a biqueira(?)e duravam mais um tempinho. Os vestidos eram feitos pela minha mãe que eram acompanhados com uns laçarotes na cabeça (na minha cabeça não paravam mais que um minuto) ficávamos sempre as "princesinhas" da minha mãe!
A vida naquela altura era muito difícil e muito diferente da que é hoje, felizmente. Eu já o relatei neste e num outro Blogue, falando do meu Pai, que muita gente que passa por aqui o pode confirmar.
Sim, já tenho passado a ferro descalça, mas acho eu que o meu ferro está com ligação à terra, mas vou ter cuidado a partir de agora!
Beijinhos Elvira

Dina disse...

É sem dúvida uma sensação única, ainda hoje gosto de andar com os pés à vontade. Uma das coisas que eu também gostava era sentar-me com os pés dentro dum chafariz que havia por detrás da casa onde eu vivia...