Os nossos "velhos"!
Já alguns dias (muitos) que não tenho escrito aqui no meu blog. O tempo, ou melhor, a falta dele e a disposição para escrever e mexer em assuntos que me incomodam não me tem deixado expressar como eu gostaria sobre o que sinto.
Por vezes quando alguém de quem gostamos muito é maltratado ou desumanizado sentimo-nos revoltados e com vontade de fazer justiça.
Mas como? Contra quem? O sistema? Os serviços de saúde? Da Segurança Social? Ou simplesmente contra o Zé ninguém que encrava o sistema e que descarrega nos outros, nos mais fracos, as suas frustrações?
A minha mãe foi para casa depois de ter estado internada num hospital. Assim de um dia para o outro, depois de nos terem dito, o próprio médico que a operou, que a situação estava difícil e que possivelmente ainda teria de ser operada novamente! O estado geral era preocupante. Dois dias depois estava em casa com a alta passada pelo mesmo médico que tinha falado connosco.
Impunha-se ajuda para a higiene e para ter as condições mínimas de bem estar para o estado em que ela se encontrava. Tem a bacia partida em dois locais, a perna esquerda deixou de funcionar. Está praticamente paralisada do lado esquerdo. Precisava de cuidados de saúde, higiene assim como uma cama articulada.
Depois de muito procurar chegámos à conclusão que não há ajuda para ninguém, pelo menos para a minha mãe. A Segurança Social não tem pessoal para ir a casa ajudar a dar banho à minha mãe! As associações que procurámos também não, a Igreja Católica igualmente se negou. Ponto assente, a minha mãe se não for a família a fazer, não terá o mínimo de qualidade de vida, nem de higiene, nem de saúde nem de comodidade. Se a família não pode tem de se contratar alguém e pagar do seu bolso. Outros tratamentos e o levantamento do doente é incumbência da família.
A Cama. Depois de MUITAS voltas conseguimos arranjar uma cama articulada. Por 4 (quatro) meses e com um depósito feito em nome da Segurança Social. Ao fim deste tempo, é retirado o doente do bem estar em que se encontra e devolver a cama ou temos de a pagar!!
Aqui entra o ZÉ ninguém! A dita cama foi cedida pala Segurança Social, mas como estava num armazém, nas instalações da Junta de Freguesia de Queluz, seria o encarregado desse armazém a “DAR” a cama. Tínhamos nós de a ir buscar, de manhã cedo, arranjando para isso transporte adequado, pois o tamanho da cama assim o exigia. Como o dito senhor tem os seus dias, (o mau humor era gritante), tinha mais que fazer, por esse motivo não estava para esperar muito. Como era sexta-feira, teríamos que esperar para segunda. Os palhaços, nós claro, depois de fazer 80/90 km, teríamos de voltar para trás de mãos vazias e deixar a minha mãe novamente sem as condições mínimas de bem estar. Depois de muito protestar e de ter de elevar o tom de voz, muita calma e paciência à mistura, conseguimos finalmente a bendita cama. Eram 3 horas da tarde! Depois de uma grande trabalheira e de muito apertar parafusos e de ligar fios e motores, peças de três camas e meia, finalmente a minha mãe teve direito a se sentir uma verdadeira rainha. Rainha por 4 meses, nada mais, nada menos.
A Médica de Família, ao fim de 15 dias, ainda não foi ver a sua doente ao domicilio, mesmo que para isso se tenha feito o pedido, uma vez que a doente não se pode deslocar ao Centro de Saúde.
Quem se aventura por estes caminhos é que se apercebe quanta miséria humana envolve os nossos "velhos". O abandono, a indiferença, o desprezo, a arrogância, a deficiência dos serviços e das pessoas a que eles têm de estar sujeitos. As portas fecham-se à nossa passagem, o "NÃO" é constante! A DESUMANIZAÇÃO é gritante.
Como é possível que “os nossos velhos” que trabalharam uma vida inteira, cuidando das famílias, cumprindo todas as obrigações como cidadãos, pagando impostos, votando para ajudar a colocar os políticos nos pedestrais onde hoje se encontram, tenham no fim da sua vida uma velhice de miséria, onde são tratados como farrapos da sociedade que nada valem, sobe a batuta da indiferença e do desprezo.
Que fazer com eles?
Escondê-los em lares, a maior parte deles clandestinos e sem o mínimo de condições para uma estadia difícil de calcular, e quantas vezes tão penosa. Caríssimos e fora do alcance da maioria dos familiares.
Empurrá-los semana após semana para casa de familiares à mingua de um carinho, tirando-os do cantinho que eles ajudaram a construir e que são deles por direito?
Futuros sem o mínimo de deferência.
"Porque o Governo os despreza, espezinha, explora, humilha, vexa – não lhes acode, não os protege, não os defende, não os agasalha, não os ama". Escrevia o outro dia Baptista Bastos. Ergo com ele a minha voz de protesto. Ninguém ama os nossos "velhos", é uma realidade.
Esquecem-se os políticos que a vantagem deles é que as suas pensões de reforma serão sempre ‘suficiente’ para pagar as doenças da sua velhice. O problema está naqueles que, ao longo da sua vida, nunca tiveram mais do que o suficiente para pagar o pão de cada dia, quanto mais pagar lares a preços astronómicos, medicação, fraldas e tudo o mais que a sua idade avançada exige.
Hoje eles, amanhã nós, e que podemos fazer para mudar esta política, despertar consciência, este sistema do diz que faz e não faz? Esta vergonha nacional?
(Quero agradecer à Elvira Carvalho a sua preocupação pela saúde da minha mãe e pedir desculpas por não ter aparecido por aqui para agradecer a sua simpatia. Um beijinho e desculpa.)
4 comentários:
Fiquei impressionada com tudo o que tem sofrido com a doença da sua mãe e a falta de ajuda. Felizmente eu acho que não é em todo o lado assim. Como lhe disse a minha mãe que é paraplégiga, esteve desde 1 de Janeiro até 12 de Fevereiro de 2005 no hospital do Barreiro com uma pneumonia com infecção cardiorespiratória.
Quando veio para casa, não conseguiamos sequer sentá-la. Vinha além disso toda em ferida pois fez alergia ás fraldas.
Não recorri á Segurança Social, mas á junta de freguesia que nesse mesmo dia me facilitou uma cama articulada por tempo indeterminado.
Fui á CATITAS, uma associação que ajuda a tratar doentes assim e só me pediram um documento do hospital em que dizia que a minha mãe tinha lá estado internada e precisava de cuidados domiciliários. Pediram-me o comprovativo de reforma e informaram-me que teria que pagar 33€ mensais.
Iam de manhã e á tardinha fazer a higiéne, que no caso da minha mãe, era lavá-la até á cintura, e as pernas, pois a parte das fraldas, era tratada por mim de duas em duas horas.
A médica de família ia duas vezes por semana, para ver como estava a evolução das feridas. Saíu do hospital a 12 de fevereiro e a médica declarou-a curada a 26 de Julho. E durante esse tempo sempre foi lá 2 vezes por semana. Por isso é que eu digo que embora estejamos no mesmo país, neste caso não parece.
Um abraço ás duas
Franky
Falamos dos velhos? Dos menos novos? daqueles que constituem um fardo? Dos que uma mísera pensão de invalidez ou de reforma nem dá para o sustento?
Ou, simplesmente, falamos deste país, pequenino mas que já foi grande, onde a sobranceria de uns afecta sobremaneira a pobreza de outros?
E fico-me por aqui.
Um beijinho e as melhoras da tua mais que tudo...
Olá Elvira
Realmente este país tem múltiplas facetas. Há os que encravam o sistema. Desde que a vida para eles corra às mil maravilhas tudo o resto não interessa. A cunha, os amigos e o compadrio cada vez se nota mais. O deixa andar. O não te rales. E depois sabes o que eu noto? A velhice para a maioria está muito longe e não querem e nem gostam de falar ou pensar nela. Depois logo se vê.
E o povo vai-se "desenrascando"! E nada se prevê, e nada se acautela. É um futuro sem projectos, como se não tivemos amanhã!
Beijinho
Olá Repórter
Falamos dos velhos, dos nossos velhos e falamos também de nós num futuro demasiado próximo. E falamos também deste País que não olha para eles, não lhes acode, não os protege, não os defende, não os agasalha e não os ama.
Obrigada amigo e um grande beijinho.
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